Por: Coelho CMS; Fagundes da Silva JF, Stilwell GT | Email: stilwell@fmv.ulisboa.pt | Fotos Catarina Coelho
Com o presente trabalho os autores pretendem dar conhecimento da ocorrência recente de um surto de intoxicação por quicuio (Cenchrus clandestinus) na ilha Terceira, Açores. Na descrição do surto são referidos alguns dados sobre as características das pastagens tóxicas, o número de animais afetados, a taxa de morbilidade e mortalidade, os sinais clínicos, as lesões macro e microscópicas e os resultados das análises sanguíneas efetuadas. Tanto quanto é do seu conhecimento, esta é a primeira vez que este tipo de intoxicação é descrito em Portugal.
Resumo
Com o presente trabalho os autores pretendem dar conhecimento da ocorrência recente de um surto de intoxicação por quicuio (Cenchrus clandestinus) na ilha Terceira, Açores. Na descrição do surto são referidos alguns dados sobre as características das pastagens tóxicas, o número de animais afetados, a taxa de morbilidade e mortalidade, os sinais clínicos, as lesões macro e microscópicas e os resultados das análises sanguíneas efetuadas. Tanto quanto é do seu conhecimento, esta é a primeira vez que este tipo de intoxicação é descrito em Portugal.
1. Introdução
A planta Cenchrus clandestinus é uma gramínea com uma natureza agressiva e uma grande capacidade invasora. Foi introduzida recentemente nos Açores para a instalação de relvados, mas rapidamente chegou às pastagens, havendo neste momento pastos compostos apenas por esta planta. A intoxicação por quicuio está descrita na literatura e foram assinalados surtos em diversas regiões do globo. Este trabalho pretende descrever um surto que ocorreu recentemente na ilha Terceira, e que os autores julgam ser o primeiro descrito em Portugal.
1.1. O arquipélago dos Açores
O arquipélago dos Açores situa-se no Atlântico Norte, a 1500 Km da Europa continental, 1450 Km de África e 3900 Km da América do Norte. É constituído por 9 ilhas, com uma área total de 2332 Km2. O ponto mais alto do arquipélago tem 2351m e situa-se na ilha do Pico. O seu clima foi classificado por Azevedo (2001) como mesotérmico húmido com características oceânicas. Caracteriza-se por elevados índices de humidade, temperaturas amenas, taxas de insolação pouco elevadas, chuvas regulares e abundantes e um regime de ventos vigorosos. A temperatura média anual ao nível do mar é de 17ºC, diminuindo 0,6ºC por cada 100 metros de aumento na altitude. A pluviosidade aumenta em função da altitude e de Este para Oeste, chegando a atingir os 3000 mm por ano. Em 2021 residiam nos Açores 236 413 pessoas (Censos 2021). O efetivo bovino no fim do primeiro semestre de 2022 era de 294 000 cabeças.
A paisagem caracteriza-se por um imenso manto verde que cobre inúmeros edifícios vulcânicos, mais ou menos preservados, que alternam com zonas de escoadas lávicas. O verde das pastagens mistura-se com o verde escuro dos milheirais ou com o castanho dos terrenos lavrados. A propriedade é dividida em parcelas de pequena dimensão (cerrados) que são delimitadas por muros de pedra basáltica, que funcionam como proteção contra os ventos e impedem o escorrimento das águas e a erosão dos solos.
A produção agropecuária é a principal atividade económica, com destaque para a bovinicultura leiteira. O clima pouco rigoroso dos Açores permite que os animais vivam todo o ano no exterior, por isso são raras as estruturas para estabulação ou armazenamento de alimentos. A raça Holstein é a raça predominante. Os bovinos pastoreiam todo o ano e a base da alimentação é a pastagem natural, complementada por forragens conservadas ou por concentrado. O pastoreio é rotativo e assegura uma correta gestão da pastagem natural, prevenindo também o pisoteio excessivo que levaria à destruição da camada vegetal. A delimitação com cercas elétricas permite uma utilização mais intensiva dos pastos. A ordenha é feita, na maioria das explorações, na própria pastagem com recurso a máquinas móveis.
1.2. O quicuio ou grama australiana
A espécie Cenchrus clandestinus (antes denominada Pennisetum clandestinum) é uma gramínea com uma natureza agressiva e uma grande capacidade invasora, usando diversas estratégias para sobreviver, eliminar a concorrência e ocupar os espaços. É uma planta com ciclo fotossintético C4, como o milho, o sorgo ou a erva do Sudão, o que lhe dá vantagem em condições de alta temperatura e luminosidade e a tornam mais eficiente no uso da água.
É conhecida nos Açores por quicuio, grama, gramão ou grama australiana. No Brasil é conhecida por capim-quicuio. O seu nome deve-se ao facto de ser originária das regiões montanhosas da África Oriental, lar do povo Quicuio. A partir do Quénia é introduzida noutros países africanos, nomeadamente Zaire, Zimbabué e África do Sul, disseminando-se a partir daí para as Américas, Ásia e Oceania. É uma planta herbácea perene, rasteira, rizomatosa, com estolhos extensos e muito ramificados. Os colmos vegetativos podem atingir até 30 cm de altura, com folhas lineares plana (15 x 0,2-0,5 cm). Reproduz-se de forma sexuada (dezenas de sementes/planta/ano) e assexuada (estolhos) o que facilita imenso a sua disseminação e dificulta o seu controlo. Vive em terrenos cultivados e zonas verdes de origem antrópica, nas pastagens e prados de ambientes alterados e em zonas urbanizadas. Gosta de crescer entre a Primavera e o Outono em zonas húmidas e quentes. Por ser fácil de cultivar e formar uma rede de esteiras densa, é uma espécie muito apreciada para a implantação de relvados, embora possa ser semeada com a intenção de formar pastagens, como aconteceu na Austrália e Nova Zelândia. Forma rapidamente tapetes densos que não deixam crescer as outras plantas, seja por ensombramento ou por produzir toxinas herbicidas que matam as plantas concorrentes. É resistente ao corte, ao pastoreio e a muitos herbicidas. Esta planta é considerada uma das top 100 espécies invasoras nos arquipélagos dos Açores, Madeira e Canárias, tendo sido registada pela primeira vez na Madeira em 1940 e nas Canárias em 1950. Em 18 de Maio de 2009 foi emitido um alerta pelo Departamento de Biologia da Universidade dos Açores porque a sua presença havia sido notada próxima do aeroporto de Ponta Delgada, no entanto pensa-se que a sua introdução na região terá ocorrido antes daquela data, provavelmente no fim do século XX ou início do século XXI. A sua introdução foi intencional e destinava-se à criação de relvados em jardins particulares, parques recreativos, campos de golfe ou elementos rodoviários. A invasão das pastagens ocorreu, seja porque estes espaços ajardinados se encontravam próximos, seja porque os restos dos cortes dos relvados foram despejados diretamente nos pastos. Atualmente já existem pastagens que são constituídas apenas por quicuio.
1.3. A intoxicação por quicuio
Casos de intoxicação de bovinos, ovinos e caprinos depois de pastorearem em pastagens de quicuio têm sido reportados ocasionalmente desde o início da década de 1960 na Nova Zelândia, Quénia, Rodésia, África do Sul e Austrália. Os surtos ocorrem esporadicamente, surgem repentinamente e têm uma duração curta, sendo muito restritos em termos geográficos. Esta imprevisibilidade e rapidez torna difícil o estudo da doença.
1.3.1. A causa
A combinação de circunstâncias que resultam em intoxicação por quicuio são afortunadamente raras e infelizmente pouco conhecidas. A causa definitiva desta maleita e/ou a toxina envolvida permanecem um mistério. O fungo endófito Fusarium torulosum é o principal suspeito mas ainda não foi estabelecida uma relação causa-efeito. Este fungo é encontrado com frequência nas folhas das plantas de quicuio em pastagens tóxicas. Os efeitos das suas toxinas são consistentes com as lesões encontradas nos animais que são vitimados por esta intoxicação. Há autores que defendem que a toxina está na própria planta e lhe confere um gosto diferente. Os animais conseguem aperceber-se desse gosto e essa seria a razão porque, por vezes, os animais deixam algumas zonas por pastorear. Estas plantas podem recuperar a sua palatabilidade mais tarde.
1.3.2. Fatores predisponentes
Os surtos ocorrem normalmente na transição Verão – Outono, depois de um período de seca seguido de chuva abundante que faz crescer rapidamente as plantas de quicuio. Os animais colocados nestas pastagens 2 a 3 semanas depois da chuva estão em grande risco de se intoxicarem. As pastagens deixadas por pastorear durante longos períodos, com uma grande camada vegetal morta e um aspeto envelhecido, podem ser as mais perigosas. Para se desencadear a doença é muito importante que os animais estejam em pastagens só de quicuio, não tendo possibilidade de escolher outro alimento. Outros fatores que provoquem stresse nas plantas (gafanhotos, lagartas, etc.) também podem desempenhar um papel na doença. No entanto, Bourke (2007) na sua revisão sobre a doença, elimina estas causas, bem como os nitratos e os oxalatos.
Os bovinos são a espécie mais afetada por este tipo de intoxicação, mas as ovelhas e as cabras também são suscetíveis. Animais de qualquer idade ou em qualquer condição podem ser afetados. Parece não haver uma predisposição de espécie, raça, género ou idade.
1.3.3. Quadro clínico
Os animais podem mostrar sinais clínicos de 1 a 8 dias depois de entrarem nas pastagens tóxicas (média 3 dias). Estes sinais podem demorar até 8 dias para reverterem, depois da retirada dos pastos tóxicos. Os sinais mais precoces parecem ser distensão abdominal, fezes moldadas e secas e bosteiras volumosas. Os animais mostram-se apáticos, ligeiramente hipotérmicos e sem leite. À medida que a doença progride nota-se a salivação (saliva cai em fio), agravamento da desidratação e, por vezes, paralisia e ptose da língua. Os animais podem mostrar um comportamento denominado “beber em falso” (sham drinking) que consiste em permanecer próximo dos bebedouros e mergulhar o focinho na água, mas sem beber. A vocalização pode ser anormal. Os animais podem mostrar fraqueza muscular, incoordenação, cambaleio, deambulação, marcha com elevação exagerada dos membros e períodos intermitentes de recumbência, sinais que espelham um quadro de crise abdominal grave. Com o aproximar da morte, devido à distensão ruminal e ao decúbito, a respiração torna-se rápida e superficial, aumentam os batimentos cardíacos, o pulso torna-se fraco. A temperatura corporal pode subir. O animal já não se consegue levantar e morre passado algum tempo.
1.3.4. Morbilidade e mortalidade
Tendo em conta todos os animais que estão em risco, a percentagem que adoece varia entre 13,6 e 64,2% e podem morrer entre 8,9 e 32% destes animais. Se nos focarmos apenas nos animais afetados, a mortalidade varia entre 16,7 e 95,6%. Depois das mortes começarem, podem continuar por um período que varia entre 1 e 8 dias (média 4 dias), mesmo que os animais sejam retirados imediatamente das pastagens. Os surtos são rápidos mas cobram um número elevado de vítimas.
1.3.5. Lesões
Os achados mais frequentes no exame post mortem são a dilatação do rúmen com erva e uma excessiva quantidade de líquido. Pode haver alteração das mucosas dos pré-estômagos, com áreas inflamadas e tendência para separação, e consequente eliminação, da mucosa. O intestino delgado está normalmente vazio e o conteúdo do intestino grosso está normalmente seco. Um achado frequente e muito característico são hemorragias no epicárdio e endocárdio, dando um aspeto enegrecido ao coração quando se abre o saco pericárdico.
1.3.6. Tratamento e prevenção
Não existe tratamento conhecido, no entanto os animais que ingeriram pouca toxina podem recuperar por si se forem retirados das pastagens tóxicas. Nunca se sabe quando se reunirão as condições necessárias para desencadear um surto, no entanto podem ser tomadas algumas medidas preventivas:
– a planta será tóxica na transição do Verão para o Outono;
– nesta época deve-se evitar pastorear pastos só de quicuio, principalmente se a planta está com um crescimento rápido;
– oferecer outros alimentos aos animais (silagens, fenos, etc.);
– o quicuio deve ser pastoreado de forma agressiva às 4-5 folhas; após cada pastoreio deve ser passada uma gadanheira ou um corta-mato para evitar a formação de uma camada vegetal morta;
– não se devem usar pastagens envelhecidas, que não são pastoreadas há muito tempo;
– estas pastagens envelhecidas devem ser cortadas, mas a erva deve ser rejeitada e não deve ser ensilada nem fenada;
– estar atento aos primeiros sinais de intoxicação (dilatação abdominal, fezes secas e volumosas).
2. Surto na ilha Terceira
2.1. Caracterização das explorações envolvidas
O surto aqui descrito ocorreu entre os dias 5 e 12 de outubro de 2022. Na altura em que foi detetado, os autores já tinham conhecimento da ocorrência de um surto semelhante na ilha do Faial, que vitimou, pelo menos 15 animais, e outro na ilha do Pico. Foram detetados casos de suspeita de intoxicação por quicuio em 5 explorações da ilha Terceira, cujos dados se encontram no Quadro 1.
Nestas explorações, as pastagens onde se encontravam os animais eram constituídas apenas por quicuio. Os animais encontravam-se em pastoreio livre ou amarrados, a comer “à borda”. Os grupos afetados foram vacas aleitantes e novilhas, e estes animais alimentavam-se apenas da pastagem, sem serem suplementados com concentrado ou silagens.
O ano de 2022 foi particularmente chuvoso na ilha Terceira, sendo que não se verificou a existência de um período de seca, típico dos meses de verão. Deste modo, as pastagens cresceram rapidamente, ultrapassando a velocidade de pastoreio dos animais. Este crescimento exagerado levou a que as pastagens de quicuio criassem uma abundante camada morta na base das plantas, dando um aspeto envelhecido aos pastos (Figura 1).
A morbilidade deste surto foi de 58% e a taxa de mortalidade nos animais expostos foi de 27,5%. Se considerarmos apenas os animais afetados, a taxa de mortalidade sobe para 47%.
2.2. Quadro clínico observado
Numa fase inicial da doença, os sinais clínicos observados foram: fezes secas, moldadas e volumosas; dilatação abdominal; apatia; ligeira quebra da produção leiteira. Os sinais clínicos acima referidos agravaram–se nos dias seguintes, tendo os animais demonstrado: incoordenação motora; quebra acentuada da produção leiteira; hipotermia; aumento das frequências cardíaca e respiratória; mucosas pálidas ou amareladas; tremores musculares, nas regiões da cabeça, pescoço, membros torácicos e tórax; desidratação; salivação moderada (baba em fio); “beber em falso” (mergulhavam o focinho no tanque de água, mas não bebiam); fezes com sangue vivo ou digerido; presença de um “ping” na zona superior do abdómen esquerdo, à auscultação. Numa fase final, os animais já não se conseguiam levantar, apresentavam salivação excessiva, gemidos, hipertermia ou hipotermia, desidratação grave e mucosas muito pálidas ou amareladas. Chegando a esta fase, a morte ocorria, em média, passadas 2 a 6 horas.
Foram efetuadas várias tentativas de tratamento sintomático nos animais afetados, contudo, não foi possível salvar os animais com um quadro clínico moderado a grave. A retirada dos animais das pastagens tóxicas foi sempre a primeira medida adotada, o que permitiu reverter o quadro clínico nos animais que se encontravam em fase inicial de intoxicação.
2.3. Análises efetuadas
Procedeu-se à colheita de sangue de 8 bovinos das explorações afetadas, sendo que, desses 8 animais, 7 estavam doentes e 1 era coabitante. As análises sanguíneas revelaram essencialmente a presença de um quadro inflamatório generalizado, com comprometimento do fígado e dos rins.
Durante o surto, procedeu-se ao exame post mortem de 3 animais vitimados e à colheita de amostras de alguns órgãos para análise histopatológica, a fim de confirmar se as alterações causadas por esta intoxicação, descritas na literatura, também estavam presentes neste surto.
Os exames post mortem revelaram a presença de inflamação dos 4 estômagos, com presença de úlceras na parede interna do abomaso (Figura 2). Os intestinos delgado e grosso, o fígado, os rins, a bexiga e o coração também apresentavam sinais de inflamação, com zonas hemorrágicas. Um dos animais apresentava sangue coagulado no interior do intestino grosso (Figura 3). As hemorragias no coração foram o achado mais consistente dos 3 exames post mortem efetuados (Figuras 4 e 5).
Foram enviados para análise histopatológica os seguintes órgãos: coração, fígado, baço, abomaso, intestino delgado, cólon, rim direito, bexiga e pulmão. Confirmou-se a presença de lesões microscópicas compatíveis com inflamação e congestão.
Procedeu-se ainda à colheita de amostras das pastagens das explorações 1, 2 e 3 e estas foram enviadas para o laboratório do INIAV, para pesquisa de Fusarium e, se possível, das suas toxinas. Apesar de não ter sido detetado Fusarium torulosum, foram detetadas outras espécies de Fusarium (sambucinum, incarnatum-equiseti, heterosporum, graminearum e avenaceum) e ainda Microdochium sp. e Pyricularia grisea.
3. Discussão e conclusão
Os surtos de intoxicação por quicuio são caracterizados pela sua evolução aguda e limitada no tempo e no espaço. O surto que ocorreu na ilha Terceira pode ser caracterizado de igual forma, uma vez que ocorreu apenas nalgumas zonas da ilha e teve a duração de 1 semana, atendendo aos casos que foram reportados. Os surtos relatados na Austrália e Nova Zelândia ocorreram após um período de grande precipitação, precedido de um período de seca prolongada. Apesar de não ter existido um período de seca na ilha Terceira no ano de 2022, pensa-se que, devido à elevada precipitação que se observou, poderão ter existido condições de temperatura e humidade propícias ao desenvolvimento do fungo que se julga ser o responsável pela intoxicação.
Como foi dito anteriormente, a intoxicação ocorre quando o quicuio é o único alimento disponível, não permitindo que os animais possam escolher outro tipo de alimento. Isto significa que as explorações em regime extensivo, em que os animais se alimentam apenas de pastagem, sem que haja suplementação da dieta com concentrado e/ou silagem, devem ficar alerta para a possibilidade de ocorrer um surto aquando do pastoreio de uma pastagem constituída apenas por quicuio, na transição do Verão para o Outono e após um período de chuva abundante.
As lesões hemorrágicas presentes no coração, as úlceras encontradas no abomaso, e ainda as lesões observadas no fígado e nos intestinos delgado e grosso poderão traduzir o caráter agressivo das toxinas do fungo Fusarium. Quer as análises sanguíneas, quer as análises à pastagem, não providenciaram um diagnóstico definitivo.
Os autores reconhecem que o modo de atuação perante este surto apresentou algumas falhas. Deste modo, num futuro surto, deverá ser feita uma abordagem mais metódica e sistemática aos casos detetados. Para que isto aconteça, dever-se-á:
– ter em conta que a época de maior risco é a transição Verão – Outono;
– monitorizar o aparecimento de sinais precoces de intoxicação – fezes secas, moldadas e volumosas, dilatação abdominal e apatia –, assim que houver dúvidas acerca da toxicidade das pastagens constituídas por quicuio;
– retirar os animais das pastagens “tóxicas”, assim que houver suspeita de se estar perante um surto de intoxicação por quicuio, fornecendo alimento alternativo;
– colher sangue dos animais que se suspeita estarem afetados (se análise mais reduzida, fazer só aos animais mais afetados);
– necropsiar todos os animais mortos, se possível, procurando colher sempre amostras dos órgãos com as lesões mais características – coração, tubo digestivo (4 estômagos, intestino delgado e intestino grosso) e fígado –, bem como líquido ruminal, para tentar fazer a identificação das toxinas;
– colher amostras de pastagens suspeitas, caso exista um laboratório que consiga identificar o fungo e/ou as suas toxinas.
É possível que no futuro nos venhamos a deparar com mais surtos de intoxicação por quicuio. Esta planta demonstra um grande potencial invasor, com rápido crescimento e grande capacidade de competição com outras plantas, o que lhe permite ir colonizando cada vez mais pastagens, acabando por se tornar a única espécie presente e disponível para os animais.
No caso da ilha Terceira tentou-se documentar o melhor possível o surto, descrevendo os sinais mais comuns, realizando as necrópsias e registando dados hematológicos, bioquímicos e histopatológicos. O isolamento de diversos fungos presentes nas pastagens envolvidas também foi importante, porque pode funcionar como base comparativa para surtos futuros.
Deixamos, assim, o registo e a descrição deste surto ocorrido na ilha Terceira, na esperança de que possa contribuir para um melhor conhecimento desta afeção.
Os autores disponibilizam-se a fornecer informação sobre a bibliografia consultada. Para tal, os interessados deverão enviar e-mail para: stilwell@fmv.ulisboa.pt