Por António Moitinho Rodrigues, docente/investigador, Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Castelo Branco; Carlos Vouzela, docente/investigador, Faculdade de Ciências Agrárias e do Ambiente da Universidade dos Açores/IITAA; Nuno Marques, Revista Ruminantes.
Analisamos neste número da Ruminantes os Índices VL e VL-ERVA para o período de fevereiro a abril de 2021. Os dados do SIMA-GPP (2021) mostram-nos que o preço médio do leite pago aos produtores individuais no continente variou entre 0,311 €/kg em fevereiro e 0,312 €/kg em março e abril. Na Região Autónoma dos Açores, o preço médio do leite pago aos produtores individuais foi mais elevado em fevereiro (0,278 €/kg) e mais baixo em março (0,276 €/kg). Consultando os dados publicados pelo Milk Market Observatory (MMO) verificamos que o preço médio do leite pago ao produtor entre fevereiro a abril de 2021 foi, mais uma vez, muito inferior em Portugal (0,2999 €/kg) quando comparado com a média da UE27 (0,3519 €/kg) (MMO, 2021). No mês de abril de 2021 Portugal foi mesmo o país em que o preço do leite pago ao produtor foi o mais baixo da UE27, com o inconcebível valor de 0,3001 €/kg de leite com 3,70% de gordura e 3,28% de proteína. No mesmo mês de abril, os preços pagos aos produtores de leite dos 5 países da UE27 com maior produção anual de leite foram os seguintes: Alemanha 0,3560 €/kg; França 0,3649 €/kg; Holanda 0,3600 €/kg; Polónia 0,3310 €/kg e Itália 0,3600 €/kg. Será que querem destruir a produção de leite de vaca em Portugal? Será esse o grande objetivo das organizações cooperativas e outras que compram leite no nosso país? Desde há vários meses que temos vindo a assistir e a alertar para o baixo valor do leite pago ao produtor português. Na atual situação sócio económica, em que os preços dos combustíveis e das matérias-primas sobem no mercado internacional, em que as dificuldades são iguais em toda a Europa e em que se pretendem tornar mais iguais os cidadãos europeus, não se pode aceitar esta enorme diferença de preços pagos aos produtores de leite. Durante o trimestre em análise, os preços das 5 principais matérias-primas utilizadas na formulação dos alimentos compostos utilizados neste trabalho sofreram um aumento médio de 13,6%. No continente português, aquele aumento traduziu-se no acréscimo de 2,3% nas despesas com a alimentação da vaca tipo, embora o preço pago pelo leite tenha diminuído 1,1% relativamente ao trimestre anterior. Nos Açores, o aumento das matérias-primas teve pouco impacto nos custos com a alimentação da vaca uma vez que na primavera os animais têm maior consumo diário de pastagem. Houve mesmo uma ligeira redução dos custos com a alimentação. No entanto, a redução acentuada de 2,7% no preço do leite relativamente ao semestre anterior anulou o efeito favorável da diminuição dos custos alimentares. A evolução do preço do leite e dos custos da alimentação refletiu-se no Índice VL e no Índice VL-ERVA que, em abril de 2021 foram, respetivamente, de 1,538 e de 1,775. De referir que, um ano antes, em abril de 2020, o Índice VL havia sido de 1,695 e o Índice VL – ERVA de 2,054. Curiosamente, na Região Autónoma dos Açores o Índice VL-ERVA foi em fevereiro 1,481 e em março 1,498, em ambos os casos inferior a 1,5. Esta situação acontece pela primeira vez em 94 meses de análise de dados, desde julho de 2013, altura em que iniciámos a determinação do Índice VL-ERVA. De realçar que o Índice VL-ERVA reflete a realidade da produção de leite mais favorável existente na ilha de S. Miguel onde se produz cerca de 60% do total de leite dos Açores. Um índice igual ou inferior a 1,5 (valor muito baixo) indica forte ameaça para a rentabilidade da exploração leiteira; um índice entre 1,5 e 2,0 (valor moderado) indica que a produção de leite é um negócio viável; um índice maior do que 2,0 (valor elevado) indica que estamos perante uma situação muito favorável para o sucesso económico da exploração (Schröer-Merker et al., 2012). NOTAS – no continente português, comparando os meses abril de 2020 e abril de 2021, verifica-se que se mantiveram iguais os preços do leite pago aos produtores. No entanto, nos Açores o preço em abril de 2021 foi 1,3 cêntimos/kg mais baixo do que em abril de 2020; – durante o trimestre em análise houve um aumento do preço de todas as matérias-primas que entram na formulação dos alimentos compostos. Esta evolução contribuiu para aumentar os preços, não só do alimento composto como também do regime alimentar formulado para o cálculo do Índice VL; – no trimestre em análise, o preço dos alimentos forrageiros utilizados na formulação do regime alimentar manteve-se; – as três considerações anteriores refletem-se nos Índice VL e Índice VL-ERVA que, em abril de 2021, foram, respetivamente, 1,538 e 1,775; – pela primeira vez, em 94 meses de análise, o Índice VL-ERVA calculado para os Açores foi inferior a 1,5 – meses de fevereiro e março de 2021; – se em abril de 2021 os produtores portugueses tivessem recebido o valor médio pago aos produtores da UE27 (0,3544 €/kg de leite), os 5,4 cêntimos/kg pagos a mais permitiriam que as explorações tivessem maior rentabilidade, contribuindo para a sustentabilidade financeira da produção de leite de vaca em Portugal.