Deolinda Silva
Diretora Serviços Técnicos Ruminantes – HIPRA Portugal
VÁRIOS ESTUDOS DEMONSTRARAM UMA RELAÇÃO ENTRE OS VÍRUS E O PRÓPRIO SISTEMA DE DEFESAS DOS ANIMAIS, PREDISPONDO QUE OUTROS AGENTES INFECIOSOS COMO BACTÉRIAS SE ESTABELEÇAM, E POTENCIEM AS LESÕES PULMONARES.
O vírus respiratório sincicial bovino (BRSV) é um dos mais importantes vírus respiratórios envolvidos no complexo da doença respiratória bovina (DRB) em animais com menos de um ano de idade, sendo os outros agentes envolvidos os vírus BVD, IBR, PI3, Coronavírus, e as bactérias Mannheimia haemolytica, Pasteurella multocida, Histophilus somni e Mycoplasma bovis.
A pneumonia bovina tem várias causas associadas, resultando de uma interação complexa entre vírus, bactérias, maneio, instalações e ventilação, condições atmosféricas, nutrição e stress. Vários estudos demonstraram uma relação entre os vírus e o próprio sistema de defesas dos animais, por um lado predispondo que outros agentes infeciosos como bactérias se estabeleçam, e por outro potenciando as lesões pulmonares.
DISTRIBUIÇÃO DO VÍRUS
A distribuição do vírus BRSV é mundial. O vírus causa, frequentemente, surtos de pneumonia durante o período de inverno, sendo responsável por cerca de 60% dos surtos de pneumonia nas vitelas leiteiras e até 70% nos vitelos de engorda. No Reino Unido, mais de 70% dos vitelos de carne foram expostos ao BRSV antes dos 9 meses de idade. O BRSV ataca o revestimento das vias respiratórias, originando danos e perfuração desse mesmo revestimento, semelhante a um pneu furado. Esta situação compromete o mecanismo de “limpeza” (depuração) dos pulmões e permite que as bactérias penetrem nos tecidos. Por vezes, as lesões podem ser tão graves que pode ocorrer uma fuga do ar das vias respiratórias para o tecido pulmonar, e em casos graves, podem desenvolver-se bolhas de ar debaixo da pele dos animais afetados, como se tivesse uma folha de embrulho de bolhas de ar debaixo da pele.
Nos surtos de BRSV, podem ser afetados elevados números de animais (60-80%) com uma taxa de mortalidade de 20-30%.
SINTOMAS E CONSEQUÊNCIAS
Os sintomas podem ser graves, variando desde mortes súbitas até depressão, febre alta, respiração pela boca em vez de pelo nariz, extensão da cabeça, formação de espuma na boca e esforço respiratório intenso. Os animais afetados com menor gravidade podem apresentar febre, dificuldade em respirar, descargas de muco transparente pelos olhos e pelo nariz.
Os animais que sobrevivem podem ficar com lesões crónicas a longo prazo nos pulmões (Foto 1). É bem reconhecido que, à medida que o número de casos repetidos aumenta, ou seja, o nº de vezes que um animal tem um caso de doença, também aumenta a severidade das lesões pulmonares e a taxa de mortalidade. Isto resulta numa diminuição do ganho médio diário e numa menor qualidade das carcaças. Está reportado que num surto, os animais que apresentaram sintomas tiveram uma relação peso/idade constantemente inferior (4-10%) durante o período de 8 meses do estudo. Isto equivaleu a um ganho de peso vivo diário reduzido de 111 g/dia.
Foto 1. Os animais que sobrevivem podem ficar com lesões crónicas a longo prazo nos pulmões.
IMUNIDADE
A imunidade do colostro (“leite tenro”) das mães pode fornecer algum grau de proteção. No entanto, apenas uma pequena proporção da proteção (anticorpos) fornecida pelo colostro sai da corrente sanguínea para proteger o revestimento das vias respiratórias. Estes anticorpos específicos estão apenas presentes durante um curto período de tempo. Assim, embora as amostras de sangue dos vitelos possam demonstrar uma quantidade adequada de anticorpos maternais na corrente sanguínea, a mais importante proteção local do revestimento das vias respiratórias (anticorpos IgA), que é mais difícil de avaliar, diminui rapidamente.
PERÍODOS DE RISCO
Existem dois principais períodos de risco para as pneumonias causadas pelo virus sincicial respiratório bovino:
- fase inicial da vida porque a imunidade dos vitelos não é a adequada para combater este vírus. Para combater o BRSV é necessário imunidade local (vías respiratorias superiores) que o impeçam de atingir os pulmões. Em idade precoce a imunidade do colostro das mães pode fornecer algum grau de proteção. No entanto, apenas uma pequena proporção da proteção fornecida pelo colostro sai da corrente sanguínea para proteger o revestimento das vias respiratórias. Estes anticorpos específicos estão apenas presentes durante um curto período. Assim, embora as amostras de sangue dos vitelos possam demonstrar uma proteção adequada na corrente sanguínea efetiva, a proteção local mais importante no revestimento das vias respiratórias, que é mais difícil de avaliar, diminui rapidamente;
- períodos de stress que ocorrem no dia a dia de uma exploração como o desmame, agrupamento de animais e contactos de risco com animais portadores do BRSV que não apresentam sintomas da doença (ex. animais adultos).
COMO ESTABELECER UM DIAGNÓSTICO
Devido à natureza disseminada do vírus, pode ser difícil estabelecer um diagnóstico.
Os sinais clínicos conforme descritos acima podem ser altamente sugestivos de BRSV, no entanto, a parasitose pulmonar aguda pode apresentar sinais clínicos semelhantes. Como habitual, é importante um exame clínico detalhado e uma história clínica completa.
Vários testes de diagnóstico estão ao dispor dos veterinários. Alguns dos testes mais simples, tal como zaragatoas nasais profundas, são fáceis de executar e podem proporcionar bons resultados.
As lavagens pulmonares são tecnicamente mais difíceis de executar, no entanto, depois de dominada a técnica, é uma ferramenta extremamente útil para um diagnóstico das causas de pneumonias.
As amostras de sangue podem ser úteis, mas é necessário ter em atenção à idade dos vitelos amostrados e à data em que ocorreu o surto. As necrópsias dos animais que morreram podem ser bastante úteis. É sempre importante preservar o cadáver até falar com o veterinário.
COMO TRATAR AS PNEUMONIAS CAUSADAS PELO BRSV
O tratamento a instituir deve estar sempre de acordo com a recomendação do médico veterinário assistente da exploração.
Pode consistir na administração de anti- inflamatórios e antibióticos de largo espectro para tratar as infeções bacterianas secundárias. O isolamento dos animais afetados é essencial para prevenir a infeção de outros animais, já que os aerossóis são o principal meio de disseminação do BRSV. A terapêutica de suporte com fluidos orais é extremamente importante já que os vitelos afetados podem diminuir a ingestão de água, ficando desidratados. Em algumas ocasiões a administração de anti-inflamatórios esteroides pode ser considerada, sendo uma das raras ocasiões que estes fármacos são benéficos na medicina bovina.
A PREVENÇÃO É SEMPRE MELHOR QUE O TRATAMENTO. COMO PODEMOS PREVENIR O BRSV?
Como em qualquer doença, efetuar corretamente os procedimentos básicos de maneio é uma grande ajuda para o controlo da doença. Uma nutrição adequada, manter a exploração fechada, maneio dos lotes de animais em sistema tudo dentro – tudo fora, as condições de alojamento e o maneio do colostro são fatores cruciais.
Também estão disponíveis no mercado diversas vacinas para controlo e prevenção do BRSV. Estas vacinas podem ser administradas por via intranasal para estimular a imunidade local rapidamente ou administradas por via sistémica em diferentes idades dos animais.
A proteção dos vitelos jovens, com menos de 12 semanas, através da vacinação é sempre um desafio, devido à interferência dos anticorpos de origem materna (imunidade colostral). As vacinas intranasais têm sido a resposta a esta questão.
ABORDAGENS ATUAIS DE VACINAÇÃO NA PREVENÇÃO DO BRSV: VACINAÇÃO “PELO NARIZ” (INTRANASAL) SEGUIDA DE REFORÇO POR VIA INTRAMUSCULAR
O conceito de expor o sistema imunitário a um antigénio (vírus), por diferentes vias, primeiro estimulação da mucosa do nariz e depois reforço sistémico por via intramuscular ou subcutânea, irá alcançar uma resposta equilibrada e mais durável a nível imunológico e deverá ser o caminho a seguir no desenvolvimento de quaisquer novas vacinas respiratórias.
A aplicação inicial da vacina pelo nariz origina duas respostas importantes. Primeiro, proporciona uma imunidade/proteção local ao revestimento das vias respiratórias em vitelos muito jovens, desde a primeira semana de vida, apesar da presença da imunidade colostral. Depois, a primeira dose funciona como preparação para a segunda dose, que pode ser administrada debaixo da pele ou por via intramuscular mais tarde. Esta segunda via oferece uma maior duração da imunidade/ proteção.
Existe uma enorme variação da eficácia e duração da imunidade das diferentes vacinas e vias de administração. É essencial seguir as recomendações dos fabricantes relativamente ao intervalo entre doses, via de administração e idade dos animais a vacinar.
CONCLUSÃO
O BRSV é uma causa importante de doença respiratória e é comum nas explorações de bovinos sendo os animais jovens os mais afetados. O BRSV é disseminado pelo ar e infeta as vias respiratórias superiores e os pulmões e a imunidade dos animais em idade precoce contra este vírus não é a adequada. A imunidade local das vias respiratórias (superiores e inferiores) é essencial para a proteção contra este vírus. A resposta imunitária às vacinas convencionais para o BRSV (via intramuscular) pode ser afetada pela anticorpos maternais. As vacinas intranasais aportam três principais vantagens na vacinação contra o BRSV: em primeiro lugar induzem a imunidade local “no nariz” (mucosa nasal) essencial para o BRSV, em segundo lugar não são afetadas pelos anticorpos maternais, e em terceiro lugar estimulam a memória do sistema imune para um posterior reforço da vacinação.
Este reforço posterior da vacina por via intramuscular, quando a imunidade de origem materna tiver diminuído, vai reforçar a imunidade local e sistémica proporcionando uma duração da imunidade protetora.
Nota: Para informações adicionais sobre o tratamento e protocolos de vacinação contra a doença respiratória consulte o médico veterinário assitente da exploração. | Referências ibliográficas: consultar o autor.
Existe uma enorme variação da eficácia e duração da imunidade das diferentes vacinas e vias de administração. É essencial seguir as recomendações dos fabricantes relativamente ao intervalo entre doses, via de administração e idade dos animais a vacinar.
Para mais informação sobre este assunto, contacte:
Deolinda Silva
Tel. (351) 915052335